Existia em mim, arraigado às minhas
entranhas, um bicho feroz.
Um parasita que vivia corroendo
minha alma.
Salivando e urrando insensatas fantasias,
Gemendo..
Inventando dores despropositadas,
Coabitando em mim... sem permissão!
Meu desespero o tornava cada vez
mais forte
enquanto eu, débil, paralisava ,
quase sucumbindo de infelicidade,
me tornando cada vez mais estéril, incapaz de
acarinhar e confiar.
A fera vivia à espreita, zelando o
mal.
As doçuras nunca eram suficientes o
bastante para me fazer sorrir.
Ele apodrecia minhas vísceras.
Tudo o que por mim era oferecido
cheirava a velho, a podre.
Até
meus pensamentos exalavam sangue.
O novo, tinha sempre odor de
naftalina.
Quando, por fugazes instantes, ele
adormecia,
experimentava respirar livre do peso que me obrigava a
rastejar.
Sabia, no entanto, que ele
despertaria mais e mais enfurecido,
estraçalhando lembranças e minando esperanças.
Vivia fadada a dor.
Meu gozo escorria putrefato.
A alegria era sempre maculada pela
dúvida.
As palavras viviam engasgadas,
causando náuseas.
E foi em meio a toda essa agonia
asfixiada pela escuridão...
Surgiu você.
Manso. Forte. Leve.
Pleno,
dominou a besta fera.
Não havia mais urros. Gritos.
Gemidos.
Apenas silêncio.
Um silêncio tão seco
Mas que trazia tanta alegria,
Que o amor nasceu assim...
Inesperado, mudo e livre.
"POSSESSED" by AUDREY KAWASAKI