27 julho 2020

ELOGIO DO BEIJO

Primeiro : desajeitado, breve e nervoso.

Lábios  tensos, fechados.

É beijo revelação!

 

Apaixonado: começa antes mesmo dos lábios se encontrarem.

Olhar, cheiro, presença.

Com intimidade... 

a língua explora, sem pressa, cada pedaço do outro

para além da boca.

Quando  lábios apaixonados se encontram 

é sempre réveillon.

É beijo de corpo inteiro!

 

Despudorado : sôfrego, intenso, agoniado.

Escorre desejo.

Os lábios são tomados com volúpia e ardor.

Dedos cravados na nuca sob o cabelo.

Corpo grudado.

É beijo de fim do mundo!

 

Tópicos : alegre, leve, carinhoso.

São sempre muitos!

Selinhos estalados e espalhados pelo corpo.

Testa. Queixo. Pescoço. Peito. Mamilo.

Coxas. Meio das coxas. Virilha...

Provoca e aquece.

É beijo borboleta!

Sedutor: erótico, enigmático, insinuante.

Inicia-se por leve roçar de bocas, narizes, respirações.

Os lábios estão se conhecendo... buscando o encaixe!

 Repletos de segundas intenções!

É beijo mistério!

 

Pele: Inexplicável e raro.

Os olhares se cruzam e automaticamente  se quer beijar.

Sem palavras. Sem delongas. Sem protocolos

Não há escapatória! Em casos assim, deve –se beijar.

Efêmero e perecível.

É beijo vento!

 

Tesão: sedento, faminto, primitivo.

Os lábios, em êxtase , engolem o outro. Literalmente.

 Mastigam – se  com a língua.

Carne. Suor. Unhas. Pulsão. Gana.

O coração batendo em bacanal.

É beijo antropofágico!

 

Pandêmico: virtual, apartado, adiado.

Bits. Bytes. Algoritmos. Telas.

Imaginação. Sensação. Idealização.

Tempo sem precisão.

É beijo esperança!


"O Beijo" - Picasso 

28 março 2020

POEMA EM TEMPO REAL OU... QUARENTENA - DIA 15

POEMA EM TEMPO REAL
OU... QUARENTENA – DIA 15
Hoje eu ouvi alguém tentando aprender a tocar piano no prédio em frente.
Sei que estava aprendendo porque o espaço de tempo
entre uma nota e outra durava uma eternidade...
Me deu muita vontade de te contar isso!
Ando com vontade de te contar um monte de coisas...
Queria te contar que te conhecer foi um susto bom!
Certamente você descobriria, não fosse a ruptura do isolamento forçado e necessário.
Nesta nova rotina, tenho tido muito tempo para pensar.
Quase sempre você atravessa meu pensamento...
por isso tenho vontade de te contar tudo!
Amenidades e profundezas!
Coisas de antes, muito antes de te conhecer e de agora.
Sabia eu detesto recolher roupa do varal?? Elas ressecam ,às vezes ,por lá...
E não consigo guardar roupa pelo lado do avesso.
Minha mãe dizia que o anjo da guarda sai do nosso corpo.
Por via das dúvidas, nunca ousei. Mais do que nunca precisamos dos anjos da guarda!
A maior parte do tempo, nesta nova rotina, tenho passado lendo, estudando...
Tentando produzir para manter a sanidade.
Numa das minhas incursões pela poesia achei um poema do Julio Cortázar que me lembrou você .
Dizia assim: “ O que mais gosto de teu corpo é o sexo
O que mais gosto de teu sexo é a boca
O que mais gosto de tua boca é a língua
O que mais gosto de tua língua é a palavra!”
Compaixão é uma palavra que me remete a você.
Você exerce compaixão diariamente, percebi em nosso primeiro encontro e isso me arrebatou.
Sim, sou dada a arrebatamentos.
Sou intensa e grave, confesso! Mas sou também riso frouxo e maré baixa.
O mar, inclusive, é uma coisa que amo!! Nasci perto do mar, isso já te contei.
O que não te contei é que, apesar de amar o mar
passei vários verões da minha adolescência trancada em casa lendo Clarice.
Tudo por vergonha do meu corpo. Aos 15 anos o mundo parece mais cruel.
Esses verões e Clarice me ajudaram a forjar a mulher que sou hoje. A mulher que ainda sente a crueldade do mundo e, exatamente por isso, não se esconde mais dele.
Aprendi a fincar pé.
Estar em casa não tem sido difícil para mim, nesses tempos estranhos! Amo o meu canto!
Ela nunca esteve tão organizada, não que antes fosse uma zona!
Uso um chinelo para andar dentro de casa e outro para andar no meu pequeno terraço! Mesmo antes do vírus já fazia assim... mania!
Outro lugar onde me sinto completamente em casa é na coxia de um teatro.
Sou bicho do palco. Bicho da arte. Há um preço nisto. Pago de bom grado!
Não tenho puderes em me expor através da arte. Outra despesa fixa!
Imagino que você já tenha percebido, em outro contexto, que não sou de pudores.
Por falar em outro contexto, noite dessas, no meio da insone madrugada,fechei os olhos e te senti inteira.
Cheiro. Voz. Boca. Barba cerrada. Nossos gostos misturados no beijo.Nossas mãos entrelaçadas e crispadas amassando o lençol.
Respirações descompassadas .Corpos amalgamados. Êxtase!!!
Por impulso quase te ligo.
No entanto, me contive.
Ser impulsiva e visceral me proporcionou momentos preciosos ao longo da minha vida e grandes encrencas, também!
Hoje procuro utilizá-las com maturidade e parcimônia.
Aqui, na minha pequena área externa, bate sol exatamente entre às 12:15h e 14:05h.
Todos os dias,nesta nova rotina, tenho vestido meu biquíni e escandalizado alguns vizinhos e vizinhas.
Não sei ao certo se pela exposição do corpo de biquíni fora do ambiente padrão ou se porque durante este intervalo tenho acompanhado meus cantores preferidos na minha play list preferida.
Sigo em dúvida pois: tenho um coração , sou desafinada e não tenho controle sobre o meu desejo de cantar!
Não vivo sem música, acho importante você saber disso.
A primeira coisa que faço ao acordar é ligar o rádio.
Provavelmente herdei da minha mãe esse gosto. Apesar da casca austera ela trabalhava cantarolando. Me parecia doce e triste.
Eu te conheço pouco mas te sinto muito. Você também me parece austero e doce.
Sinto por você um afeto desconcertante.
Quero te dizer tudo isso olhando nos olhos, quando essa tempestade passar.
Quero te dizer que você me inspirou esta crónica/poema e me inspira de muitas outras formas.
Quero te dizer!
Por ora...
Boa noite, aqui de Santa Teresa!
PS.: O meu mojito é famoso entre os amigos. Minha madrinha, nas festas de família, me pede para fazer o que ela chama de “ Chazinho verde”. Toma uma dose e gargalha carnavalescamente.
Talvez essa informação seja irrelevante para você. Talvez você se reconheça nela. Tomara que sim. É que desta vez, não pude conter o meu impulso!
Rio de Janeiro, 28 de março de 2020.

21 abril 2019

RECADO DE PÁSCOA


Feliz Páscoa!
Nem sei ao certo se você acredita em Deus,
Jesus ressuscitado ou Santíssima Trindade.
Se a Via Crucis  faz sentido em sua vida.
Não te imagino criança esperando o coelhinho trazer ovos!
Nem no amor, eu sei se você acredita.
Mas dias desses, em  um feed qualquer, vi uma sua foto
de um Réveillon antigo.
E nela você estava com cara de esperança.
Brindando o novo que chegava.
Talvez por isso tenha resolvido te enviar esse:
Feliz Páscoa!
A verdade é que estou só me aproveitando
dessa data comemorativa para , no meio da avalanche
de memes, gifs, vídeos de auto ajuda, figurinhas e emojis,tão comuns nessas 

datas,me fazer discretamente presente  na sua “time life”!
 Feliz Páscoa!
Só escrevi isso.
Mas se você ler com reparo também está
escrito, com letras bem pequenas:

Que  penso todos os dias em você.
Que sinto sua falta.
Que seu abraço é o melhor de todos.
Que sinto raiva. Muita raiva.
Que tentei te apagar de mim com outros corpos.
Que não consigo comer chocolate sem lembrar de você.
Que sou intensa mas sou também calmaria.
Que ainda acredito em nós.
Que o personagem social que você criou é incoerente e
Quando você tira a máscara fica muito mais bonito.
Que  o seu silêncio é uma grande demonstração de covardia.

É isso!
Feliz Páscoa!

Imagem: Audrey Kasawaki



18 abril 2019

FLOR NA ORELHA



Despertei  desejando  primavera.
Preciso  pular o outono e ignorar solenemente o inverno.
O verão,  com  aquele excesso de luz e sol, confunde a minha alegria.
 Ele traz a euforia irradiante
 que tristemente se apaga a cada por do sol.
Quero estar alegre. Quero ser alegre.
No entanto,  quero que seja genuína a  minha alegria.
Não precisa ser  esfuziante.
Ofuscar olhos alheios.
Inflamar cobiça.
Não!
Quero a singeleza da primavera
quando os sentimentos  se abrem  como uma rosa em botão ou se metamorfoseiam  a seu tempo.
Estar em primavera é estar em equilíbrio.
Passamos pelo outono que desfolha e sangra
Pelo inverno que congela e isola.
Pelo verão que resseca e queima.
Assim sobrevivemos.
 Cotidianamente .
Alternando estações..
Mas para prolongar a primavera;
Pendura uma flor na orelha e vai! 









08 dezembro 2018

A ARTE


Não acredito na arte estática. Plastificada.
Botocada de tendências.  Arte puramente comércio.
Não acredito na arte unânime.
Arte massa ou Arte de Massa?
Quero a arte que pulsa.
A arte que desapruma
Desestabiliza, te faz murchar e inflar em segundos.
Arte que te conforta  expondo  a carne ,  viva. 
Latejante.
Quero a arte que rasga, retalha e fornece tecido novo.
Costura firme. Agulha afiada para couro curtido.
Quero a arte que alegra , fascina e  inspira à mudança.
Arte  cheia de Bretch... 
Arejada.Livre . Engajada.
Quero a arte que confronta através do amor.
Quero a arte que se espalha...
Morro
Asfalto
Planalto
Caatinga
Pantanal
Planície
Sertão
Pampas
Arte pululante!!!
Arte e fato.
Arte : Flecha de reflexão.
Imagem: Audrey Kasawaki

21 outubro 2018

DESPUDORADOS


No meio do sexo ele  me beija a testa.
Ele pega o meu  rosto suado entre as suas mão e me beija a testa.
O mundo para  quando ele me beija a testa.

Em meio a  toda sacanagem que nos dispomos a fazer quando nos amamos, ele me beija a testa.
Despudoradamente, me olha nos olhos e me beija a testa.

Me penetra
a alma.

É o auge do prazer.
Imagem: Audrey Kasawaki